sábado, 9 de maio de 2015

Ex-funcionários contam história da Fábrica Cimento Paraíso em Italva - RJ

Eles lembram do crescimento econômico na região à série de demissões na antiga fábrica de cimento


“Nós éramos uma grande família, não pagávamos conta de água, de luz, nem aluguel. Todo mundo se conhecia e ganhava bons salários na fábrica. Depois, a gente só via choradeira. Muito ‘chefe de família’ teve que mudar de profissão ou se mudar daqui e muitos entraram em depressão”. As palavras são do aposentado Altino dos Santos que, aos seus 75 anos, lembra com ar nostálgico de como era o bairro de Cimento Paraíso, em Italva, na época em que a fábrica do mesmo nome estava em pleno funcionamento e quando ela passou por uma demissão em massa.

A história da Companhia Cimento Portland Paraíso, que hoje chama-se Calcário Paraíso e produz apenas calcário, pode ser facilmente confundida com a dos ex-trabalhadores que ainda moram na antiga vila nos arredores da indústria. A reportagem do Terceira Via esteve no local e conversou com três ex-funcionários que acompanharam o desenvolvimento e o encerramento da produção de cimento na cidade.

A história da fábrica começa na década de 40, quando Italva ainda fazia parte do território da cidade de Campos. A Cimento Paraíso foi a 2ª fábrica do estado do Rio de Janeiro e a 10ª no Brasil e é considerada grande responsável pelo desenvolvimento naquela região.

“Tinha uma fábrica pequena aqui que fechou e foi leiloada, aí os novos donos perceberam isso e compraram. Eles começaram a produzir cimento com dois fornos americanos pequenos comprados de segunda mão. Em 1950 eles tinham mais dois fornos grandes e aí foi só crescimento”, lembra Altino dos Santos.

O cenário do bairro naquela época era composto por várias casinhas pequenas, ruas de chão e ambiente familiar. O local parecia desenvolver-se mais rápido do que o restante da cidade e tinha igrejas, time de futebol, e até um cinema (atualmente abandonado). A Fábrica Cimento Paraíso tinha cerca de 600 funcionários e vendia cimento para várias cidades, inclusive de outros estados.

“Lembro que na minha época todos os funcionários da fábrica eram homens, só duas mulheres trabalhavam como enfermeiras. Tudo o que eu sei na vida eu aprendi lá”, contou o aposentado Zeno Mendonça, de 86 anos.

Ainda na década de 40 a ponte Governador Edmundo Macedo Soares, que corta o Rio Muriaé, foi inaugurada. Isso colaborou ainda mais com crescimento econômico da região, já que antes a travessia era feita com ajuda de canoeiros.

“Na época que a fábrica funcionava, aqui era mais movimentado e nossos salários eram muito bons. Operários ganhavam uns cinco salários mínimos. Os donos eram ricos demais e ajudavam a gente com várias despesas, além de pagar o salário. Sou filho de operário da fábrica, comecei a trabalhar lá com 14 anos e fiquei por quase 25 anos”, lembrou o aposentado João do Couto, 61 anos.


DEMISSÕES EM MASSA:
Foi na década de 60, no período próspero da região, em que começaram as conversas sobre a emancipação de Italva. Anos depois, em 1982, a fábrica parou de produzir cimento e demitiu grande parte dos seus funcionários. Já em 1986, quando a emancipação enfim aconteceu, Italva já vivia uma época em que muitos desempregados haviam saído para buscar oportunidades em outras cidades.

“Quando lá parou de produzir cimento, eu saí da cidade para procurar emprego. Nesta época, eles venderam as casas pra gente por um preço bem barato, porque a gente morava nas casas da fábrica de graça e se não fosse assim, íamos ficar sem teto”, João do Couto, 61 anos.

Dos cerca de 600 funcionários mantidos pela fábrica, restaram apenas cerca de 150 após as demissões. Segundo os ex-funcionários, o encerramento da produção de cimento teria várias causas, como a não modernização, a morte de um dos donos e até dificuldade em encontrar minério no local. O que sabe-se é que as demissões surpreenderam centenas de famílias.

“Eram mais de 100 demitidos de uma só vez e nas vilas era muita ‘choradeira’. Tinha muita gente desempregada ao mesmo tempo e foi muito triste porque ninguém esperava isso. Nesta época, Italva já tinha se emancipado de Campos e muitos saíram daqui para procurar emprego. Eu fui ficando e saí da fábrica em 1995 porque eu fiquei adoentado”, contou Altino.

Em 1996 o grupo Holcim comprou a fábrica, que atualmente chama-se Calcário Paraíso. A extração é feita de jazidas nos arredores e segundo a empresa, ainda restam 120 milhões de toneladas de material para serem extraídas. Enquanto isso, logo ao lado, os ex-funcionários da antiga fábrica de Cimento Paraíso ainda moram no local e vivem de boas lembranças no pacato distrito de Cimento Paraíso.

“Aqui parece que andou pra trás, porque tinha tudo para evoluir, mas quando parou de produzir cimento, o crescimento também desacelerou. Gosto de morar em um lugar tranquilo, não tem quase ninguém na rua”, contou João do Couto.

Priscilla Alves




 ANTIGO CINEMA
 VILA OPERÁRIA
ANTIGA FÁBRICA DE CIMENTO PARAÍSO E HOJE CALCÁRIO PARAÍSO

1 comentário:

  1. Ao ler essas notícias do cimento paraíso com muita emoção, eu nasci e vivi próximo a fábrica, voltei no tempo. Conheço o Altino. Obrigado por esse momento. Ademir Garcia

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